Editorial

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  • Cadernos BAD

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https://doi.org/10.48798/cadernosbad.969

Resumo

A abertura ao público do novo edifício da Biblioteca Nacional de Lisboa, acontecimento integrado no programa dos Quarenta Anos da Revolução Nacional, está prevista para o próximo mês de Dezembro. Eis uma notícia que deve entusiasmar todos aqueles que esperam os mais auspiciosos resultados do funcionamento de um elemento básico da estrutura cultural, científica e técnica do País.Como se sabe, pelo alvará de 20 de Fevereiro de 1796, D. Maria l, sendo ministro o marquês de Ponte de Lima, criou em Lisboa a Real Biblioteca Pública da Corte. Primeiramente ficou instalada no Terreiro do Paço, no segundo pavimento da arcada ocidental, tendo como seu principal recheio bibliográfico os livros da Real Mesa Censória e da Academia Real da História. Em 13 de Maio de 1797, tendo por bibliotecário principal António Ribeiro dos Santos, abriu ao público para comemorar o aniversário natalício do príncipe regente, o futuro D. João VI.No ano de 1836, a Biblioteca foi transferida para o antigo convento de São Francisco da cidade, onde ainda hoje se encontra, mesmo no centro de Lisboa, a dois passos do Chiado, da Garrett. E também desde então se escutam as costumadas - e mais que justificadas! - queixas: o edifício não tem condições, não dispõe de espaço, corre o perigo de ir pelos ares, pois vive de paredes meias com os depósitos de material exposivo da Polícia instalada no editício do Governo Civil, etc. As reclamações vinham de todo o lado. Depois o espectacular crescimento bibliográfico dos últimos, as exigências da investigação, tudo, tudo, enfim levava a adoptar-se uma solução que era imperiosa, gritante: construir-se um edifício condigno para a Biblioteca Nacional.Assim, após o Dr. Manuel Santos Estevens haver ocupado o lugar de director da Biblioteca Nacional de Lisboa (foi o primeiro bibliotecário de carreira a desempenhar tal função) em 18 de Abril de 1951, iniciaram-se os estudos preliminares de acordo com o programa apresentado em 13 de Fevereiro de 1953. O arquitecto Pardal Monteiro elaborou em 1954 o projecto que foi sujeito a estudo e depois passou a erguer-se, no Campo Grande, nos terrenos anexos à Cidade Universitária, o magnifico edifício que todos conhecem.Hoje Lisboa tem na Biblioteca Nacional o seu segundo edifício logo a seguir ao do Hospital de Santa Maria. Dispõe de 14 andares, com 17 elevadores, sala de leitura com 260 lugares e o custo final do imóvel, incluindo o seu equipamento, atingirá 110 mil contos, podendo albergar 2 milhões de volumes, ou seja o dobro do que presentemente detem o velho casarão da calçada de S. Francisco.A situação do novo edifício, no Campo Pequeno, levantou celeuma, pois o lisboeta tinha a sua Biblioteca Nacional mesmo no coração da urbe e a ela acorria sempre que precisava. Era o jornalista, era o investigador, era o estudante, que, numa simples passada, logo se encontrava a folhear o cartapácio onde colhia a indicação que precisava. Mas agora tudo se irá modificar, pois a sua nova situação obriga a deslocações morosas, tanto mais que os meios de transporte são ainda bem deficientes para tal zona da cidade.Uma outra dificuldade se quiz levantar, mas que felizmente se desfez: como o edifício se-encontra nas imediações da Cidade Universitária, houve vozes que proclamavam que a Biblioteca Nacional devia passar a depender da Universidade de Lisboa. Tais opiniões chocaram, porém, o sentimento geral do País, que entende - e aliás assim o entende todo o mundo civilizado e os técnicos da biblioteconomia mais considerados - que a Biblioteca Nacional tem funções específicas, bem diferentes das bibliotecas universitárias. Cada uma tem a sua área de acção delimitada com muita precisão, sem possibilidade de confusão. Só quem não ande a par dos grandes problemas biblioteconómicos é que pode ter opinião assás peregrina: tornar a Biblioteca Nacional de um país em Biblioteca Central de uma universidade... Felizmente que esta ideia morreu, sem deixar grande rasto... Ninguém quer já assumir o peso de uma enormidade tão extensa... Ora a Nação orgulha-se, justamente, de ir inaugurar em Dezembro próximo um belo e moderno edifício, de características funcionais, aliás a segunda biblioteca funcional do País. A cultura passa, pois, a dispor de um instrumento magnífico, de um utensílio precioso.Mas agora dois novos problemas se põem, base de todo o futuro deste extraordinário investimento que a Nação fez - 110 mil contos!, caso bem raro entre nós e que devemos aplaudir com as mãos ambas, pedindo que se repitam com muita frequência iniciativas do género.Ora os dois graves problemas consistem no seguinte:a) Qual o quadro de pessoal de que a nova biblioteca vai dispor?b) Qual a verba anual com que ela vai ser dotada para expediente, para manutenção, etc., etc., enfim para desenvolver complexos e vastos serviços?Estes dois problemas são a base de todo o futuro da Biblioteca Nacional, pois se ela fôr dotada de escassos disponibilidades económicas, então o belo investimento que a Nação fez ao erguer o magnífico edifício do Campo Grande não se justifica, pois a Biblioteca Nacional não cumprirá a sua alta missão, será um corpo vasto mas sem vida, incapaz de realizar o que a cultura nacional exige neste momento tão grave da sua existência.Quanto ao primeiro problema, bem sabemos que escasseia o pessoal superior, pois os que saiem anualmente do Curso de Bibliotecário-Arquivista (e vá lá que no presente ano lectivo requereram exame de admissão ao referido Curso oito candidatos! ...) não dão para as necessidades do País. Por isso aBiblioteca Nacional- que deve ter um quadro amplo e cada vez mais qualificado sob o ponto de vistaCientífico e técnico - não poderá abrir desde logo todas as suas secções. Mas o essencial - e todos o conhecem - é que os técnicos das bibliotecas sejam equiparados aos outros técnicos superiores do Estado - e já haverá bibliotecários e arquivistas em número suficiente e bem preparados, dado que acorrerão ao Curso e satisfarão as necessidades imediatas!Quanto à segunda questão, o orçamento há-de ser generoso e bem amplo. É de salientar que ùltimamente, graças aos planos de fomento, a cultura tem sido dotada com mais largas verbas. No entanto, no capítulo das bibliotecas e arquivos, isso ainda não se verificou infelizmente. Se não se tiver presente que assim há-de acontecer, então a Biblioteca Nacional de Lisboa não poderá ser o instrumento de apoio ao esforço cultural, científico técnico, que o País está a fazer. Como estrutura dessa renovação deve colocar-se em ponto bem saliente esta Biblioteca.Portanto um só caminho tem a Administração Pública de tomar: ser compreensiva e inteligente dotando a Biblioteca Nacional com quadro de pessoal suficiente e prová-la com orçamento capaz e suficiente.Se assim não se fizer, então não valerá a pena transferir a Biblioteca Nacional do velho casarão de S. Francisco, mesmo no coração da cidade, para o funcional edifício do Campo Grande, um ponto ainda periférico da grande Lisboa... Então melhor será não se utilizar o segundo edifício da capital ...Mas quem desejará assumir tal responsabilidade?.. Ninguém, pelo que se impõe uma só via: a da dotação ampla em funcionalismo e em orçamento.

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Publicado

01-10-2004

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BAD, C. (2004). Editorial. Cadernos BAD, (4). https://doi.org/10.48798/cadernosbad.969

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