Meditação ao inaugurar-se o novo edifício da Biblioteca Nacional de Lisboa
DOI:
https://doi.org/10.48798/cadernosbad.1134Resumo
Ao cabo de cento e setenta e três anos, isto é, desde a sua criação no distante ano de 1796, que se aspirava por tal. Eis-nos hoje a dispor no País de uma magnifica Biblioteca Nacional, moderna, ampla, concebida com largueza de vistas e magnífico sentido técnico. Realmente temos de nos orgulhar por que esse edifício haja sido concebido, gizado e erguido tendo sempre à sua frente um bibliotecário, técnico de carreira - Manuel Santos Estevens, que está a presidir aos destinos da Biblioteca Nacional de Lisboa desde 1951.
Com o apoio decidido do Ministério das Obras Públicas, ergueu-se no Campo Grande um monumento realmente perene à cultura nacional. Assim temos agora a possibilidade real, com um conjunto desta natureza, de dar passos agigantados no caminho de uma verdadeira transformação de toda a nossa actividade bibliográfica e biblioteconomica.
Para que tão extraordinária realização resulte, há que prover o novo edifício de duas coisas:1) De pessoal técnico e de rotina classificados; 2) De dotações orçamentais suficientes para a efectivação integral de uma longa série de objectivos concernentes a uma biblioteca Nacional.
Se, porém, não lhe forem facultadas todas estas condições, então apenas ficaremos com um belo edifício, de linhas exteriores agradáveis - mas, por dentro, um casarão sem vida, sem interesse, perfeitamente inútil para a cultura nacional. E lá se vão, água abaixo, uns cento e trinta mil contos...
Hoje em dia uma Biblioteca Nacional é um delicado organismo técnico que não se compadece com dotações irrisórias ou soluções de acaso. Tudo deve ser aí estudado e planeado por técnicos, não se admitindo que figuras apenas conhecidas pelo seu valor literário ou intelectual ocupem qualquer posto de direcção, pois elas nada conhecem de problemática tão complexa. A vontade de acertar não chega, tomo a obra literária também não satisfaz para aqueles postos... E será bom recordar neste momento um facto: é pela primeira vez no historial das nossas bibliotecas e arquivos que temos à frente da Inspecção-Superior das Bibliotecas e Arquivos um bibliotecário diplomado, o Dr. Luís Silveira, à frente do Arquivo Nacional da Torre do Tombo, outro técnico diplomado, o Dr. José Pereira da Costa, e da Biblioteca Nacional de Lisboa o Dr. Manuel Santos Estevens. Bom é, pois, que se saliente o facto para provar que em tais, lugares só técnicos poderão e deverão estar.
*
Aquando da inauguração da Biblioteca Nacional de Lisboa em 10 de Abril p. p., esperava-se que fosse anunciada ao País a reforma, a revisão da situação económica dos bibliotecários e arquivistas. Tal, porém, não se fez. Ao que consta ficará para mais tarde, mas para breve, o anúncio de uma tão importante decisão, base primordial de uma autêntica reforma nas nossas estruturas biblioteconómicas e arquivísticas.
Na verdade, se não viesse essa reforma, então seria de entoarmos todos um requiem pela profissão em Portugal. E pior, muito pior: um requiem pelas nossas bibliotecas, pelos nossos arquivos, pelos nossos centros de documentação. E quem diz tal, diz: pela cultura portuguesa. Todos estejamos cônscios da afirmação, para que amanhã não haja surpresas e lamentações: será a morte autêntica, sem apelo, se acaso não viesse essa urgente reforma.
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